2024-09-19 HaiPress
Brumadinho: desastre em 2019 fez com que barragens a montante fossem proibidas pela Agência Nacional de Mineração — Foto: Douglas Magno
GERADO EM: 19/09/2024 - 06:00
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Após as tragédias de Mariana (MG),em 2015,e de Brumadinho (MG),em 2019,as mineradoras que atuam no Brasil começaram a incrementar suas políticas de sustentabilidade para evitar mais desastres,se adequar a novas exigências regulatórias e reduzir os impactos da mineração. Além da eliminação de barragens a montante — do mesmo tipo das que se romperam nos municípios mineiros —,cuja utilização foi proibida pela Agência Nacional de Mineração (ANM) em 2019,ações como empilhamento de rejeitos a seco,reaproveitamento de água e substituição de combustíveis fósseis por renováveis se tornaram mais frequentes no setor.
De acordo com boletim da ANM com dados de julho deste ano,há no país 53 barragens de rejeitos alteadas a montante — consideradas mais baratas e menos seguras do que as construídas por outros métodos — enquadradas na Política Nacional de Segurança de Barragens. Por determinação legal,todas estão em alguma etapa de descaracterização,como é chamado o processo em que a estrutura usada para armazenar rejeitos de mineração (espécie de lama que sobra do processamento de minérios,composta por resíduos de rochas,areia e água) deixa de exercer sua função e é reincorporada ao meio ambiente.
A Vale,envolvida nos acidentes de Mariana e Brumadinho,iniciou em 2019 um programa para descaracterizar 30 barragens a montante até 2035. Desde então,cerca de R$ 9 bilhões foram investidos no projeto,e 14 estruturas já foram eliminadas. Uma delas é a B3/B4,em Nova Lima (MG),que foi totalmente descaracterizada em maio deste ano e se tornou a primeira da companhia ser eliminada após entrar em nível 3 de emergência,o mais alto da escala,que indica que a ruptura da estrutura é iminente ou já está ocorrendo. A meta é não ter nenhuma barragem em nível máximo de emergência até 2025. Segundo a Vale,todas as suas estruturas a montante no Brasil estão inativas e são monitoradas 24 horas por dia.
Revolução em andamento. Mineradoras avançam com ajuda da tecnologia,que reduz risco para trabalhadoresProdução em alta. Exploração de diamante no Brasil cresce com mais reservas identificadasUS$ 64,5 bilhões até 2028. Transição energética impulsiona investimento na mineração
Paralelamente ao programa de descaracterização,a mineradora vem expandindo a adoção de tecnologias de processamento de minério de ferro a seco,que não não usam água e,portanto,não geram rejeitos,dispensando a necessidade de barragens. O método já é empregado em mais de 70% da produção — em 2014,a taxa era de 40%. Nas operações nas quais ainda é preciso água para o beneficiamento,devido às características do minério extraído,os rejeitos são filtrados para retirada da umidade. Depois,é feito o empilhamento de cerca de 80% do material em estado sólido. Entre 2021 e 2023,a Vale implantou quatro plantas em Minas Gerais com capacidade para filtrar 60 milhões de toneladas de rejeitos por ano. O plano é chegar a 2027 com US$ 2,2 bilhões investidos em sistemas de filtragem e empilhamento.
As pilhas de disposição de rejeitos são uma solução mais cara,mas que apresenta risco menor para o meio ambiente do que as barragens. De acordo com o diretor de Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram),Julio Nery,o endurecimento das exigências para o licenciamento ambiental de barragens nos últimos anos tem ajudado a impulsionar o uso do empilhamento a seco. O método ainda proporciona ganho de eficiência na gestão de recursos hídricos:
— A questão do consumo de água é fundamental para as mineradoras. E a filtragem do rejeito aumenta a recuperação de água na própria instalação de beneficiamento do minério.
A Mineração Morro do Ipê,que faz extração de minério de ferro em Minas Gerais,adotou esse sistema de filtragem em suas unidades de processamento em 2019 e,desde então,toda a disposição de rejeitos é feita em pilhas. A água retirada do material retorna para uso tanto no processo industrial quanto em outras atividades,como a limpeza das rodas de equipamentos de transporte. Em 2023,o índice de reaproveitamento de água na companhia bateu 83%,o que ajudou a reduzir a captação hídrica de fontes da natureza. O consumo de água nova foi de 160 litros por tonelada de minério processado,19% a menos do que em 2022.
Outra ação da empresa para economizar água é a utilização de polímeros para aspersão das vias internas da mina,o que também ajuda a diminuir o impacto causado pela poeira nas operações.
— Os ganhos com a recirculação de água vão além do aspecto financeiro. Temos um menor consumo de energia elétrica no sistema de bombeamento de água nova,a cerca de dez quilômetros da nossa mina,o que aumenta a vida útil dos equipamentos — ressalta o CEO da Mineração Morro do Ipê,Jayme Nicolato.
Ainda dentro das práticas de circularidade,a Mineração Morro do Ipê reciclou,no ano passado,60% dos resíduos coletados,o que incluiu pneus,plásticos,metais,papéis,papelão,madeira,óleo usado e lixo orgânico. Antes,em 2022,foi selada parceria com outra empresa mineira para transformar rejeitos em 1.300 metros quadrados de tijolos-bloquetes,que foram usados na pavimentação do estacionamento da mineradora.
— Nossa intenção é aumentar a produção dos tijolos,que poderão ser utilizados para pavimentar vias internas e externas e beneficiar as comunidades que hospedam nossas operações — completa Nicolato.
O uso sustentável de energia é outra preocupação crescente entre as mineradoras. Na operação da Kinross na mina Morro do Ouro,em Paracatu (MG),97% da energia consumida vêm de fontes renováveis. A maior parte (cerca de 70%) é proveniente de duas usinas hidrelétricas localizadas em Goiás,adquiridas pela companhia em 2018.
A empresa está substituindo bombas de água movidas a diesel,utilizadas no beneficiamento do ouro,por bombas elétricas,e trocando torres de iluminação a diesel por outras alimentadas por energia solar. Se,em 2021,as torres solares correspondiam a apenas 15,5% do total,hoje elas já representam 58% dos equipamentos. Com as novas bombas e torres,2.200 toneladas de CO2 deixarão de ser emitidas por ano.
Para promover a recuperação ambiental das áreas mineradas,a Kinross mantém,desde 2017,o projeto Viveiros Comunitários na comunidade de Santa Rita,em Paracatu. A mineradora construiu 20 viveiros florestais onde moradores cultivam mudas de espécies nativas da região com insumos fornecidos pela empresa. Depois,essas mudas são compradas pela companhia e plantadas nas áreas degradadas.