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Trump pressiona América Latina a endurecer guerra às drogas em meio à expansão de rotas e maior demanda global

2025-03-11 HaiPress

Policiais mexicanos cercam laboratório de fentanil suspeito de ser operado pelo cartel de Sinaloa — Foto: Meridith Kohut/The New York Times

RESUMO

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GERADO EM: 10/03/2025 - 20:19

Trump Pressiona América Latina por Guerra às Drogas Mais Dura

Donald Trump intensifica a pressão sobre a América Latina para endurecer a guerra às drogas,enquanto a demanda por cocaína e fentanil cresce globalmente. A Europa viu um aumento de 60% no consumo de cocaína na última década. O relatório do Crisis Group revela que a abordagem dura dos EUA aumentou a violência e os lucros dos cartéis,que se adaptaram com redes fragmentadas. Novas rotas pelo Pacífico tornam países como Costa Rica e Equador estratégicos.

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Eleito sob a promessa de impor lei e ordem aos Estados Unidos (e além),o presidente Donald Trump tem pressionado países da América Latina a endurecer a guerra às drogas no momento em que organizações criminosas turbinam suas atividades para atender à alta demanda na Europa e nos EUA,enquanto novos mercados na Ásia e na Oceania ganham força. Se nas décadas anteriores a preocupação de Washington se concentrava na Colômbia e no México,um estudo do Crisis Group publicado nesta terça-feira aponta uma reconfiguração do mapa regional,com a expansão de rotas para países antes ignorados pelo narcotráfico,mas que hoje são peças-chave do esquema.

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Segundo o relatório,a política linha dura defendida pela Casa Branca tem produzido,nos últimos anos,mais violência na região e maior lucratividade para os cartéis,que repassam suas perdas aos consumidores e ampliam seus mercados mundo afora. Embora a caça aos chefões do narcotráfico tenha se notabilizado a partir dos anos 1980,tais operações não têm mais o mesmo impacto na cadeia como um todo,hoje muito mais sofisticada e menos verticalizada. Agora,facções transnacionais terceirizam as etapas a gangues menores,que veem na desigualdade socioeconômica da região uma janela de oportunidade para recrutar cada vez mais membros.

— Estamos profundamente preocupados com a retórica beligerante de Washington,principalmente porque as evidências apontam que essas medidas duras de repressão,especialmente prisões e extradições de líderes,criam vácuos dentro das organizações criminosas,que,após a disputa pelo poder,acabam se dividindo — analisa ao GLOBO Elizabeth Dickinson,analista sênior do Crisis Group e uma das autoras do estudo. — Hoje,como a cadeia de suprimentos do tráfico de drogas é muito fragmentada,as intervenções do Estado não afetam a capacidade de a droga transitar de um ponto a outro.

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Novas rotas

A expansão das rotas de produção e distribuição no continente aumenta o desafio de combater os cartéis,que adaptaram o negócio para contornar as autoridades,diz o estudo — que entrevistou mais de 200 pessoas em cinco países da região,incluindo agentes de segurança e ex-membros de grupos criminosos.

Além da produção de cocaína,maconha e heroína,os grupos diversificaram suas atividades comercializando drogas sintéticas,como metanfetamina e fentanil,e adotando práticas como extorsão e sequestros. "Em vez de sindicatos hierárquicos que poderiam ser desmantelados quando seus líderes fossem identificados,o comércio funciona cada vez mais por meio de redes de fornecedores que subcontratam cada etapa da rota com operadores de nível inferior",aponta o documento.

No novo mapa regional,a maior parte da cocaína segue sendo cultivada na Colômbia,com presença também no Peru e na Bolívia e,em menor escala,na Guatemala,em Honduras e no sul do México. Os caminhos,no entanto,mudaram,explica o Crisis Group. Hoje,a principal rota para os EUA e a Europa passa pelo Pacífico,tornando países antes intocados pelo tráfico,como Costa Rica e Equador,em áreas de trânsito estratégicas.

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O relatório revelou a progressão no valor do quilo da pasta-base de coca,usada na produção de cocaína,durante o tráfico. Segundo o Crisis Group,o material sai da Colômbia custando US$ 550,subindo para US$ 800 quando chega nas cidades fronteiriças do Equador e US$ 1 mil no porto equatoriano de Guayaquil,principal ponto de saída de drogas da América Latina para a Europa pela via marítima. Em 2021,o preço da cocaína após o refino no Equador era de US$ 2 mil por quilo,mas ao chegar na Europa Ocidental os valores podem alcançar US$ 40 mil.

Alta demanda

As transformações na cadeia acontecem no momento em que a demanda por drogas em mercados estrangeiros atinge níveis recordes,especialmente de cocaína na Europa (cujo consumo aumentou 60% na última década) e de fentanil nos EUA,aponta o relatório. Novos mercados também estão crescendo na Ásia e na Oceania,onde é possível praticar preços mais elevados,segundo o Crisis Group. O cenário levou o cultivo de cocaína na Colômbia a quadruplicar na última década,enquanto a sua produção global dobrou.

O aumento do consumo também é um problema local. Na América Latina,o uso de narcóticos dobrou entre 1990 e 2010. Segundo um levantamento da Organização dos Estados Americanos (OEA) de 2019,o consumo de cocaína aumentou em quase metade dos países latino-americanos,enquanto o de metanfetamina disparou no México,principal produtor da droga no mundo.

Em 2024,a ONU apontou um crescimento no consumo de drogas de modo geral,com 292 milhões de pessoas assumindo ter feito uso de narcóticos no ano anterior.

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Ameaça intervencionista

Desde que retornou à Casa Branca em janeiro,Trump ameaçou impor tarifas a países vizinhos que não agissem para conter o narcotráfico,sobretudo de fentanil,e assinou decretos que abrem margem para ações militares diretas de Washington em países latino-americanos.

Uma das medidas mais simbólicas foi a designação de oito grupos da região como terroristas,entre eles os poderosos cartéis mexicanos de Sinaloa e Jalisco Nova Geração,o venezuelano Trem de Aragua e o colombiano Clã do Golfo — rompendo com uma tradição dos EUA,que geralmente aplica o título a grupos que,como o Estado Islâmico (EI),usam a violência como arma política,não para fins lucrativos. Embora as penalidades sejam sobretudo econômicas,no passado tal rótulo foi um primeiro passo para justificar operações no Afeganistão e na Síria.

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Em janeiro,Trump deixou em aberto se a classificação como dos cartéis mexicanos como terroristas implicaria uma invasão ao território mexicano,enquanto aliados republicanos vêm defendendo intervenções militares. Recentemente,o bilionário Elon Musk,à frente do Departamento de Eficiência Governamental (Doge,em inglês),disse que os grupos estariam "elegíveis a ataques de drones".

Até o momento,o combate a narcotraficantes na América Latina tem acontecido em parceria com governos locais,a exemplo da Colômbia e do México,que mantêm acordos com os EUA há décadas. Mesmo no Brasil há casos de colaborações. No mês passado,veio a público que o governo do Rio de Janeiro está articulando com os EUA para que o Comando Vermelho (CV) seja classificado como organização terrorista,em meio às negociações de um acordo de cooperação.

Alternativas

De acordo com o Crisis Group,grande parte das medidas de pulso firme adotadas na América Latina desde que os EUA capitanearam a guerra às drogas no mundo,nos anos 1960,se mostraram ineficazes. No campo retórico,porém,elas angariam apoio de muitos setores populares.

— Os eleitores latino-americanos estão muito preocupados com o crime organizado,então apoiam essas estratégias mais duras — explica Dickinson. — Mas essa repressão vem junto com a falsa narrativa de que isso limitará de alguma forma a sua influência e o nível de violência que exercem na população.

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De acordo com o estudo,a "maior aplicação da lei,mais apreensões e uma proibição mais forte tendem a aumentar o preço das drogas e,assim,elevar os lucros dos traficantes". Segundo o Crisis Group,táticas como capturar chefões do tráfico e exterminar plantações tornaram as redes de tráfico de drogas mais fortes e dispersas geograficamente. "Onde antes havia cadeias de suprimentos verticais e cartéis dominantes,agora há uma série de criminosos competindo violentamente entre si ou em conluio lucrativo uns com os outros",explica a organização.

— Não existe uma cura única para o ecossistema criminoso transbordante da América Latina,embora as experiências passadas sejam prova do que não funcionou — afirma Renata Segura,diretora do programa de América Latina e Caribe no Crisis Group e também autora do estudo. — A repressão militar e as prisões de alto nível geram vitórias de curto prazo,mas sempre alimentam novas ondas de violência e levam a reconfigurações das estruturas criminosas.

Para Dickinson,"não há bala de prata" para resolver a questão:

— A alternativa é uma combinação de intervenções que realmente se concentrem na redução da violência,melhor policiamento e,em alguns casos,até mesmo o diálogo com grupos criminosos.

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