2024-12-19 IDOPRESS
Presidente eleito dos EUA,Donald Trump,durante entrevista coletiva em Mar-a-Lago,na Flórida — Foto: Andrew Harnik/Getty Images/AFP
GERADO EM: 18/12/2024 - 19:10
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Em setembro de 2023,pouco mais de um ano antes de chegar à Presidência dos EUA pela segunda vez,o então pré-candidato Donald Trump disse,em uma rede social,que caso vencesse a eleição,a imprensa seria “minuciosamente examinada por sua cobertura conscientemente desonesta e corrupta de pessoas,coisas e eventos”.
Em entrevista coletiva: Trump diz que imprensa é 'quase tão corrupta quanto as nossas eleições' e promete 'corrigi-la'Artigo: Como a guerra silenciosa contra a liberdade de imprensa pode chegar aos EUA
Mesmo antes da posse,a ofensiva contra a imprensa começou a sair do papel. Na semana passada,Trump firmou um acordo para encerrar um caso contra a rede ABC e receberá US$ 15 milhões (R$ 94,5 milhões) de indenização. Na segunda-feira,entrou com ação contra um jornal de Iowa,citando a publicação de uma pesquisa,dias antes da eleição,mostrando que ele seria derrotado pela democrata Kamala Harris no estado.
No processo contra o Des Moines Register,os advogados do presidente eleito querem a "responsabilização pela interferência eleitoral descarada” supostamente cometida pelo jornal e por uma de suas analistas políticas,J. Ann Selzer,citando a pesquisa do dia 2 de novembro que apontava Kamala Harris três pontos percentuais à frente do republicano. Trump levou Iowa com 13 pontos de vantagem,mas o processo mostrou que ele não esqueceu ou perdoou o incidente.
"O 'erro' de Selzer nas pesquisas não foi uma coincidência espantosa — foi intencional. Como o presidente Trump observou: 'Ela sabia exatamente o que estava fazendo'",afirmam os advogados na ação,que busca uma indenização e uma ordem proibindo o Des Moines Register de se envolver em "atos e práticas enganosas". O jornal alega que as acusações não têm base legal,segundo a agência Reuters. Selzer não se pronunciou.
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Presidente eleito dos Estados Unidos,discursa na recepção da Bolsa de Valores de Nova York,após ser nomeado "Pessoa do Ano" da revista Time pela segunda vez — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Presidente eleito dos Estados Unidos,após ser nomeado "Pessoa do Ano" da revista Time pela segunda vez — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Donald Trump é escolhido Pessoa do Ano pela revista Time: 'Renascimento político incomparável na História americana' — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Investidores assistem Trump discursar na Bolsa de Valores de Nova York — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Presidente eleito dos Estados Unidos já havia recebido tal reconhecimento em 2016,quando ascendeu à Casa Branca pela primeira vez — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Investidores assistem Trump discursar na Bolsa de Valores de Nova York — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Sam Jacobs,editor-chefe da Time,escreveu na revista que a escolha não foi difícil: “No auge de sua segunda Presidência,todos nós — desde seus apoiadores mais fanáticos até seus críticos mais fervorosos — estamos vivendo na Era de Trump.” — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Presidente eleito dos Estados Unidos,e sua esposa Melanie — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Donald Trump é escolhido Pessoa do Ano pela revista Time: 'Renascimento político incomparável na História americana' — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
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Pessoas assistem ao discurso do presidente eleito Donald Trump após ser escolhido como Pessoa do Ano — Foto: David Dee Delgado / AFP
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Donald Trump é escolhido Pessoa do Ano pela revista Time: 'Renascimento político incomparável na História americana' — Foto: SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
Dias antes,a rede ABC concordou em pagar US$ 15 milhões em indenização a Trump,fruto de um acordo para encerrar um processo movido contra a empresa e ligado a declarações de um de seus âncoras,George Stephanopoulos. No começo do ano,o jornalista afirmou,durante uma entrevista,que o presidente eleito havia sido condenado pelo estupro de uma escritora nos anos 1990 — na ação,o republicano alegou que a condenação foi por “abuso sexual”,e que foi caluniado pelo jornalista.
— Deveria ter sido o Departamento de Justiça ou outra pessoa,mas eu tenho que fazer isso. Custa muito dinheiro fazer isso,mas temos que endireitar a imprensa — afirmou Trump,durante uma entrevista coletiva em Mar-a-Lago. — Nossa imprensa é muito corrupta. Quase tão corrupta quanto nossas eleições.
Os dois casos podem ser os primeiros disparos da guerra à imprensa prometida pelo presidente em 2023,quando sequer sabia se chegaria às urnas por causa de seus agora praticamente enterrados processos criminais. Uma guerra em que já começa em vantagem,por estar no poder a partir de janeiro,e por causa do próprio setor de mídia.
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Na semana passada,a revista Rolling Stone mostrou um pouco do que as autoridades do governo Trump 2.0 preparam para a imprensa e seus críticos. Planos que foram sintetizados por uma pessoa que participou das discussões.
— Vai ser brutal — disse a fonte,um advogado conservador que esteve com Trump e seu círculo íntimo,citado pela Rolling Stone. — Se preparem,[porque] aprendemos nossas lições da primeira vez e uma lição é que você tem que ser ainda mais agressivo.
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Um alvo preferencial serão os vazamentos internos. Segundo a revista,Trump quer criar escritórios dentro do Departamento de Justiça e do FBI para investigar o repasse de informações confidenciais,e não descarta derrubar uma regra adotada pelo governo de Joe Biden que impede a apreensão de telefones de jornalistas por agentes federais.
No começo do mês,Trump pressionou para que o Senado barrasse uma lei aprovada na Câmara,com o apoio dos dois partidos,que criava mecanismos de proteção do sigilo da fonte. Ele conseguiu: o projeto estava encaminhado para aprovação por aclamação,mas um senador,Tom Cotton,apresentou uma objeção,interrompendo o processo e efetivamente enterrando a medida.
— A mídia liberal não merece mais proteções — disse Cotton no plenário. — A carteira de imprensa não o torna melhor do que o resto da América ou o coloca acima da Lei.
Os profissionais da mídia poderão,de acordo com a Rolling Stone,ser enquadrados com mais frequência na Lei de Espionagem,e o indicado por Trump para o FBI,Kash Patel,comparou jornalistas a conspiradores em uma entrevista ao estrategista político (e ex-presidiário) Steve Bannon,em 2023.
— Nós vamos atrás de vocês. Seja criminalmente ou na esfera civil,nós vamos descobrir isso — disse Patel,se referindo às “pessoas na imprensa que ajudaram Joe Biden a burlar as eleições presidenciais”,uma alegação repetida por trumpistas desde 2020 e que jamais foi comprovada. — Mas sim,estamos avisando todos vocês,e Steve,é por isso que eles nos odeiam. É por isso que somos tirânicos. É por isso que somos ditadores.
Kash Patel,indicado por Trump para chefiar o FBI em seu segundo governo,chega ao Senado dos EUA — Foto: Kevin Dietsch/Getty Images/AFP
O (pré-)governo Trump 2.0 mostra ainda que não pensará duas vezes antes de processar jornalistas e veículos. Mesmo com mecanismos legais de proteção robustos hoje nos Estados Unidos,o que torna difícil condenações ligadas ao trabalho da imprensa,o simples fato de entrar na Justiça já cria dores de cabeça a profissionais e empresas,além de causar constrangimentos públicos.
O advogado e ex-integrante do Departamento de Justiça Lloyd Green aponta,em artigo no jornal Guardian,para outra possível baixa da ofensiva trumpista: segundo ele,existe o risco da Suprema Corte derrubar a jurisprudência conhecida como New York Times vs. Sullivan,de 1964. A decisão,considerada um marco na liberdade de imprensa nos EUA,dificulta processos de entes públicos contra jornalistas.
“Na visão deles,figuras públicas enfrentando a imprensa deveriam ser auxiliadas por um ônus menor da prova”,escreveu o advogado.
Dois juízes — Clarence Thomas e Neil Gorsuch — deram a entender que,caso a jurisprudência seja analisada em plenário,votarão pela derrubada. Hoje,a Corte é composta por seis membros de viés conservador,incluindo Thomas e Gorsuch,e três de viés progressista.
Jeff Bezos,dono da Amazon e do Washington Post — Foto: Eric BARADAT / AFP
As ameaças já começaram a surtir efeito.
Em outubro,o Washington Post anunciou que,pela primeira vez em 36 anos,não endossaria um candidato à Presidência,um movimento que levou a uma rebelião interna que culminou com a saída de vários integrantes do núcleo editorial — segundo fontes internas,um texto a favor de Kamala Harris já estava pronto,mas foi barrado. Em artigo,o dono do jornal,o bilionário Jeff Bezos,defendeu a decisão,afirmando que os endossos criam uma “percepção de viés”. Bezos,que deve se encontrar com Trump em breve,vai doar US$ 1 milhão para a cerimônia de posse do republicano.
Outro a desistir de apoiar um candidato foi o Los Angeles Times,uma decisão que provocou críticas internas e pedidos de demissão — a publicação também endossaria Kamala. O dono do jornal,o bilionário Patrick Soon-Shiong,recentemente pediu aos seus jornalistas que “dessem um tempo” nos ataques ao republicano.
O próprio acordo da ABC,em um caso que especialistas afirmam que a empresa poderia ganhar,dá novos sinais de mudanças no setor de mídia dos EUA.
— Comparada à grande imprensa americana de uma década atrás,a imprensa de hoje é muito menos robusta financeiramente,muito mais ameaçada politicamente e exponencialmente menos confiante de que um determinado júri valorizará a liberdade de imprensa,em vez de abraçar um ataque a ela — afirmou RonNell Andersen Jones,professora de Direito da Universidade de Utah,ao New York Times.