2024-11-22 HaiPress
Mezzosoprano Carla Rizzi em cena de de “Hilda Furacão,a ópera” — Foto: Divulgação / Rapha Garcia
GERADO EM: 21/11/2024 - 17:39
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Carmen,Elektra,Norma,Aida... Hilda. Seguindo a tradição centenária de óperas sobre mulheres complexas e de muita personalidade,“Hilda Furacão,a ópera” é o mais novo projeto da Orquestra Ouro Preto em parceria com o compositor Tim Rescala. Após apresentações no Theatro Municipal de São Paulo no início do mês,a obra passa hoje pelo Palácio das Artes,em Belo Horizonte,antes de desembarcar no Rio para duas récitas na Cidade das Artes,no domingo e na segunda-feira.
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A ópera é uma adaptação do romance “Hilda Furacão”,do escritor mineiro Roberto Drummond,publicado originalmente em 1991. O texto rendeu ainda uma minissérie homônima,sucesso nas telas da Globo em 1998. Criada por Glória Perez e com direção geral de Wolf Maya,“Hilda Furacão” imortalizou Ana Paula Arósio e Rodrigo Santoro nos papéis de Hilda e Frei Malthus.
— Normalmente,a linguagem da ópera tem essa imagem de ser elitizada,mas é desejo da Orquestra Ouro Preto escolher temas que sejam próximos das pessoas. E este é o caso de “Hilda Furacão” — diz Julliano Mendes,responsável pela direção cênica do espetáculo. — Tem sido incrível receber o retorno do público através das redes sociais. Muitos falando que “Hilda” foi a primeira experiência deles com óperas. É muito bonito isso. Queremos fazer uma obra popular que toque o coração das pessoas.
Tenor Jabez Lima como Frei Malthus em "Hilda Furacão,a ópera" — Foto: Divulgação / Rapha Garcia
Com música original e libreto de Tim Rescala,a ópera conta (e canta) a história de Hilda (vivida pela mezzosoprano Carla Rizzi),uma jovem que deixa de lado sua vida de prestígio para se refugiar na zona boêmia da Belo Horizonte dos anos 1960 e se prostituir. Sua jornada desperta uma série de conflitos ao entrelaçar-se com a de Frei Malthus (o tenor Jabez Lima),um jovem religioso que tenta transformar a vida dos moradores da área.
— O pano de fundo para a história é a situação política do país,em particular em Belo Horizonte,com um embate entre o conservadorismo representado pela Dona Loló Ventura e a liberdade simbolizada pela Hilda. A desobediência de certos princípios morais,muito conservadores,em uma BH muito católica,me pareceu muito interessante e operístico — destaca Rescala. — É importante observarmos,hoje em dia,o que acontecia naquela época que parece ser igual ao que vivemos hoje em termos de embate do conservadorismo com os aspectos mais progressistas da vida e da sociedade.
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O compositor conta que não chegou a assistir à adaptação televisiva da obra,tendo tirado toda a sua inspiração do texto original e de gêneros musicais que marcaram o período retratado,como a marcha-rancho,a bossa nova,os boleros,as big bands dos anos 1960.
Rescala comemora o atual momento da cena lírica no Brasil. Há dois anos,o músico lançou três óperas: “O engenheiro”,sobre o engenheiro André Rebouças; “O boi e o burro no caminho de Belém”,adaptação de peça escrita por Maria Clara Machado; e “O auto da Compadecida”,adaptação de obra de Ariano Suassuna que marcou a primeira parceria com a Orquestra Ouro Preto.
— Vejo o cenário da ópera no Brasil de forma muito positiva e até surpreendente. João Guilherme Ripper tem lançado muitas óperas. Aldo Brizzi,compositor ítalo-brasileiro,acabou de lançar uma ópera muito bonita com Gilberto Gil. O público está cada vez mais interessado — aponta. — Ano passado,foram dez mil pessoas assistindo a “O auto da Compadecida” na Praia de Copacabana. Esse pensamento elitizado de que o povo não vai entender é bobagem. O povo se toca,se sensibiliza,ele precisa é de oportunidade. O cerne da ópera é ser um espetáculo popular.
Regente e diretor musical do novo espetáculo,o maestro Rodrigo Toffolo valoriza ainda a importância de se investir em histórias brasileiras cantadas em português.
— O português é uma língua tão bonita e cheia de detalhes,mas que muita gente tem dificuldade para entender em óperas. Como pode? É que não nos acostumamos a ter nosso idioma cantado — diz o maestro. — Se pensarmos em “O guarani”,de Carlos Gomes,vemos Ceci e Peri cantando em italiano. Era o padrão da época,mas hoje precisamos cada vez mais investir em óperas em português. A música brasileira está aí,e precisamos investir nela.
Também responsável pela regência de “O auto da Compadecida”,Toffolo destaca a parceria com Rescala e adianta que o time prepara uma nova adaptação de obra brasileira contemporânea para o primeiro semestre de 2025,mas por enquanto não revela qual em razão de negociações de direitos autorais.
Sucesso nas telas da Globo no fim dos anos 1990,“Hilda Furacão” está disponível no Globoplay desde 2021 pelo Projeto Resgate. Mas foi recentemente que a série voltou a se destacar como fenômeno cultural a partir do sucesso dos chamados edits,vídeos curtos feitos especialmente para o TikTok. Além de cortes com cenas da obra,muitos vídeos viralizaram com tutoriais sobre como reproduzir o figurino e o visual de personagens da série,especialmente a Hilda vivida por Ana Paula Arósio.
Segundo números do Globoplay,o crescimento no consumo da obra foi de 347% entre novembro de 2023 e janeiro de 2024.
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Embora a minissérie não tenha servido de inspiração para a composição musical,envolvidos em “Hilda Furacão,a ópera” não negam a influência da obra televisiva.
— A série influencia,sim,a ópera pela referência no olhar do público. A gente sabe que as pessoas entram no teatro tendo como referência a imagem da Ana Paula Arósio,do Rodrigo Santoro. A gente opta por ter o romance como principal referência,mas com certeza o visagismo vai conversar com a série. As pessoas irão reconhecer a referência da série em alguns cenários e personagens — diz o diretor Julliano Mendes.
Quem também confirma a influência da minissérie é a atriz e mezzosoprano Carla Rizzi,que dá vida a Hilda na ópera.
— Já tinha visto a série quando ela foi lançada,eu era muito garota e lembro de ficar encantada com a atuação da Ana Paula Arósio. A partir do convite,eu procurei o romance e revi a série. A Ana é uma atriz de uma força muito grande e uma beleza física extraordinária. Com certeza,a série me influenciou pessoalmente — diz a protagonista.
Rodrigo Santoro e Ana Paula Arósio em "Hilda Furacão" — Foto: TV Globo
Amiga de longa data de Rescala,Rizzi se emociona ao lembrar que o músico compôs a ópera já com ela em vista para o papel.
— É um papel incrível de uma mulher à frente de seu tempo. Ela fez o que quis,da maneira que achou melhor,com um coração muito grande,uma alma muito sincera. Como cantora de ópera,vejo essa personagem com uma riqueza emocional e psicológica muito grande.