2024-09-21 HaiPress
Na cidade da Praia,o preço de um percurso de autocarro é de 43 escudos (0,38 cêntimos do euro),mas,muitas vezes,os passageiros pagam com uma moeda de 50 escudos (0,45 cêntimos do euro) e recebem troco insuficiente,por falta de moedas,gerando discussões.
Fausto Gomes é condutor de autocarros públicos há vários anos e nunca tinha vivido uma situação idêntica. Viu-se obrigado a sair do veículo e deixou-o na paragem,para pôr termo a uma discussão com uma passageira,a quem não tinha trocos para entregar.
A cliente não desarmava,"estava chateada",gritava e queria seguir viagem.
"Eu disse que naquela situação não ia a lugar nenhum,suspendi a viagem e disse para todos apanharem o próximo autocarro",contou o motorista.
Tudo por causa da escassez de moedas,que é tema nas ruas e nas redes sociais.
Fausto Gomes disse à Lusa que os conflitos por falta de trocos já têm originado casos mais complicados,em que é preciso chamar a polícia.
"O problema está mais na falta de [moedas de] dois escudos. Não está a circular,mesmo. Nós trocamos nas lojas,mas fazemos oito horas de serviço" e não é possível conseguir obter moedas que cheguem.
"Nem no banco,não há. E nós sofremos na pele,todos os dias",relatou,dizendo que a situação dura há cerca de um ano.
Por vezes cabe ao motorista cobrir do seu próprio bolso faltas,ao fim de cada dia,o que é cada vez mais frequente porque há cada vez mais passageiros a pagar por valor inferior,antecipando a falta de troco e "aquilo que sobra" nalguns bilhetes,não chega para a diferença.
Edite Vaz,empregada doméstica que apanhava o autocarro todos os dias para ir trabalhar,contou à Lusa que já deixou de o fazer,porque o motorista nunca tinha troco suficiente.
"Em minimercados também dizem que não têm e dão-nos uns 'drops' [rebuçados]",relatou.
Marlene Vaz,vendedora de frutas numa banca,na rua,no bairro de Achada Santo António,tem perdido tempo a procurar trocos nas imediações e,quando regressa,os clientes já foram embora.
"Outros nem esperam para irmos trocar,dizem que não têm tempo e acabamos por perder a venda",lamentou.
Ailton Gonçalves,taxista,disse à Lusa que já deixou clientes dentro do carro para ir à procura de trocos.
Noutras ocasiões,deixou os clientes saírem,"sem pagar,porque não há nada a fazer",ou seja,com o tempo que iria perder à procura de troco,pode apanhar outros passageiros.
Natalina Fernandes vende 'fresquinhas' (sumo gelado em saquetas) nas ruas da capital,por 20 a 25 escudos (0,18 a 0,22 cêntimos do euro),mas com a escassez de moedas,a venda tem ficado cada vez mais difícil.
"Perco muitas vendas porque há quem compre com [uma nota de] 500 (4,5 euros) ou de 1.000 escudos (nove euros),à espera de troco,mas não tenho",explicou.
A Lusa questionou o Banco de Cabo Verde (BCV) sobre o assunto,mas o regulador do sistema financeiro remeteu para um comunicado emitido a 02 de agosto,em que refere haver "um reforço do 'stock' de moedas,em curso",como tem feito noutras alturas.
Anunciou ainda um estudo sobre o uso da moeda e uma campanha de sensibilização para que,quem as tenha guardado em casa,possa depositá-las nos bancos ou utilizá-las nos pagamentos do dia-a-dia.
O BCV indicou ainda desconhecer teorias que circulam para tentar justificar a escassez -- como uma suposta fundição de moedas no país --,mas disse manter "estreita articulação" com a Polícia Judiciária,com vista à investigação de eventuais práticas ilícitas.